Cada vez mais, a ansiedade vem-se tornando uma companheira presente e indesejada, no nosso dia a dia acelerado, repleto de cobranças internas e externas. As responsabilidades familiares, as relações sociais cada vez mais superficiais, as pressões no trabalho e a constante conectividade digital vêm sobrecarregando nossas mentes, levando a um estado persistente de alerta, preocupação e apreensão.
No entanto, é importante destacar que nem toda ansiedade pode ser controlada apenas através de mudanças no estilo de vida. Caso esteja enfrentando sinais e sintomas de algum tipo de problema de saúde mental, é importante consultar um médico que irá explorar um diagnóstico diferencial e as opções de tratamento como terapia e medicamentos, além das mudanças na dieta e no estilo de vida.
Com o aumento dos níveis de ansiedade em todas as faixas etárias, principalmente após a pandemia de COVID-19, buscamos, cada dia mais, informações sobre alternativas para driblar a ansiedade aguda e evitar a ansiedade crônica, esse mal estar físico, mental e emocional que coloca em risco o nosso bem-estar, o nosso equilíbrio e as nossas conquistas pessoais, profissionais e financeiras. Acreditaria se eu lhe dissesse que, afora a condução medicamentosa necessária em alguns casos, também existe uma maneira natural de domar esse furação que parece indomável? No entanto, é importante destacar que nem toda ansiedade pode ser controlada apenas através de mudanças no estilo de vida. Caso esteja enfrentando sinais e sintomas de algum tipo de problema de saúde mental, é importante consultar um médico que irá explorar um diagnóstico diferencial e as devidas opções terapêuticas, além dos cuidados com a alimentação, com o sono, dentre outros.
A ciência da nutrição aliada aos estudos em neurociência vêm revelando, nos últimos anos, a profunda conexão entre o que comemos e como nos sentimos. De onde você pensa que vem o suprimento constante de nutrientes para manter em funcionamento o nosso cérebro, sempre “ligado”, que cuida dos nossos pensamentos, aciona os nossos movimentos, administra nossa respiração e nossos batimentos cardíacos e aperfeiçoa os nossos sentidos, mesmo quando estamos dormindo? Vem dos alimentos e tudo o que comemos pode afetar diretamente ou indiretamente a estrutura e a função do nosso cérebro e, consequentemente, nosso humor e nosso comportamento. Este guia básico irá orientá-lo(a) sobre opções alimentares para a calma, um estado mais tranquilo, revelando como a nutrição também pode ser sua aliada no controle da ansiedade.
A Base da Tranquilidade: os nutrientes essenciais e suas fontes
Tente imaginar nossa mente como um jardim exuberante. Para florescer, ela precisa da terra fértil, de água, da nutrição adequada e dos cuidados permanentes. Um padrão alimentar saudável age como um dedicado jardineiro, cultivando esse jardim de diversas formas: combatendo inflamações, fortalecendo nosso sistema imunológico, alimentando novas células nervosas, protegendo nosso sistema nervoso contra danos e equilibrando a nossa flora intestinal. E não pára por aí: ele atua “ligando” e “desligando” genes que influenciam o humor e o bem-estar além de afetar os hormônios e os neurotransmissores. Em outras palavras, a alimentação saudável exerce um papel fundamental na modulação do estresse e da inflamação e na preservação da função cognitiva, cultivando uma mente resiliente, capaz de florescer mesmo diante dos desafios da vida.
Além de uma dieta equilibrada e saudável, a suplementação de micronutrientes, como as vitaminas e os minerais) e os macronutrientes (como os ácidos graxos) costuma nos proporcionar muitos efeitos benéficos, devido às suas funções biológicas. Dentre os componentes dietéticos que são particularmente importantes para a saúde mental, as pesquisas vêm apoiando um papel positivo dos seguintes nutrientes na nossa saúde mental:
- Ômega 3: a melodia da calma: é um ácido graxo saudável, abundante componente das membranas celulares das células cerebrais facilita a comunicação entre elas e tem poderosa função anti-inflamatória. Esse ácido graxo essencial é encontrado em peixes como o salmão, sardinha e atum, nas sementes de chia e de linhaça, nas nozes, algas marinhas dentre outros. Estudos indicam que a suplementação com ômega 3 pode reduzir significativamente os sintomas de ansiedade. (Su et al,2018)
- Magnésio: o mineral relaxante: O magnésio age reduzindo a excitabilidade dos neurônios e promovendo o relaxamento. Ele é crucial para a produção de GABA, um neurotransmissor que atua como um freio para a ansiedade. É muito importante abastecer nosso corpo com alimentos ricos em magnésio, como espinafre, acelga, sementes de abóbora e amêndoas. (DiNicolantonio et al., 2018)
- Vitaminas do Complexo B: o combustível da serotonina: Especialmente as vitaminas B6 e B12 são essenciais para a produção de serotonina, o neurotransmissor estabilizador do humor, e para a prevenção da perda de neurônios. Baixos níveis de serotonina estão associados à ansiedade e à depressão. Incluir em nossa dieta alimentos como carne, fígado, mariscos, peixe, caranguejo, queijo fermentado, ovos, tofu, leguminosas e grãos integrais, pode garantir um suprimento adequado dessas vitaminas. (Kennedy, 2016)
- Vitamina D: a sentinela solar da mente: A vitamina D, atua na produção de neurotransmissores como a serotonina, que regula o humor, o sono e o apetite, e na proteção dos neurônios contra danos. Estudos relevam que baixos níveis de vitamina D estão relacionados a um risco aumentado de depressão, ansiedade e outros transtornos mentais bem como à perda de memória. Importante lembrar a importância da exposição solar segura e diária, que permite a absorção da vitamina D. Dentre as suas fontes estão o salmão, a sardinha, o atum, a gema de ovo, etc.
- Zinco: o escudo antioxidante: Estudos indicam que o zinco está envolvido no processo de formação de novos neurônios, e na plasticidade sináptica, ou seja, na capacidade do cérebro se adaptar e aprender. Além disso, ele parece influenciar a resposta ao estresse oxidativo, que pode danificar as células nervosas e contribuir para a ansiedade. Ostras, carne bovina, castanhas de caju e sementes de abóbora são excelentes fontes de zinco (Swardfager et al., 2013)
- Selênio: a centelha da serenidade: Junto com o zinco, o selênio é ingrediente-chave para a síntese e regulação de neurotransmissores, também desempenhando um papel importante na imunidade e na saúde da tireóide. Encontramos selênio nas castanhas-do-pará, amêndoas, castanhas, avelãs, pistaches, lentilhas, grão-de-bico, feijão preto e amendoim.
- Vitamina C: a fagulha da resistência: A vitamina C, um poderoso antioxidante, destaca-se por sua capacidade de proteger as células contra os danos causados pelos radicais livres, que são moléculas instáveis que podem prejudicar o DNA e as membranas celulares. Ela é crucial para o nosso bom desempenho cognitivo e vem demonstrando ter efeitos promissores na redução do estresse e da ansiedade. Dentre as fontes alimentares temos as frutas cítricas (acerola, limão, laranja, goiaba), pimentão, morango, brócolis etc.
- Vitamina E: o elixir da juventude cerebral: Um antioxidante que protege as células contra danos associados ao estresse oxidativo e aos processos inflamatórios cerebrais. Embora as evidências ainda sejam preliminares, alguns estudos sugerem que a vitamina E pode ter um papel na estabilização do humor e na redução dos sintomas de ansiedade e depressão. As fontes alimentares de vitamina E estão nas sementes de girassol, nas amêndoas, no amendoim, no espinafre, abóbora, pimentão vermelho, nos óleos vegetais etc.
Outras fontes naturais que acalmam a mente
Além das citadas anteriormente como fontes de ácidos graxos e vitaminas, você pode tentar incorporar mais desses alimentos que também contribuem para a redução da ansiedade no seu dia a dia:
- Hidratação adequada mantém nossa circulação fluindo, auxilia na digestão e ajuda nosso corpo a absorver os nutrientes dos alimentos, dentre outros benefícios. A água é o componente mais abundante no nosso corpo, essencial para a vida e para o bom funcionamento de todos os órgãos e sistemas. Essa quantidade de água pode variar de acordo com a idade, o sexo, a massa muscular e a quantidade de gordura corporal mas, em média, ela representa cerca de 60% do peso corporal de um adulto. Importante destacar que a desidratação atrapalha a produção de serotonina, aumenta o estresse corporal e esgota a energia do nosso cérebro.
- Probióticos como kefir, iogurtes (com culturas vivas e ativas) e alimentos fermentados como chucrute, kimchi e vegetais fermentados.
- Prebióticos, que são fibras que alimentam os probióticos, encontradas em bananas, alcachofras, aspargos, alho, cebolas, cevada, aveia e maçãs.
Ambos, probióticos e prebióticos, alteram o microbioma intestinal e interferem na saúde mental visto que 90% da nossa serotonina e 50% da nossa dopamina são produzidas pelo nosso intestino. Essa descoberta fascinante destacando a complexa interação entre o intestino e o cérebro, vem revolucionando as condutas relacionadas aos transtornos mentais e comportamentais.
- Proteínas com triptofano podem ser úteis para melhorar os sintomas da ansiedade. O triptofano, um aminoácido essencial que atua como uma chave na produção de serotonina, quando em níveis adequados, promove a calma, o relaxamento e a regulação do humor e ainda pode regular o sono. As fontes de triptofano na natureza são encontradas nos ovos, na soja, nas sementes (como abóbora, chia, cânhamo e gergelim), nos peixes (como salmão, atum e garoupa) e em qualquer tipo de carne.
- Chás calmantes como os de camomila, lavanda e maracujá, possuem propriedades relaxantes e podem auxiliar na redução da ansiedade.
Quais os alimentos que devemos evitar e que podem contribuir para o agravamento da ansiedade?
Açúcar. Alimentos com alto índice glicêmico podem aumentar drasticamente o açúcar no sangue, o que vem acompanhado por um grande aumento de insulina para reduzi-lo. Isso pode resultar em hipoglicemia, desencadeando um aumento de epinefrina, o que pode contribuir para os sintomas de ansiedade como tremores, suor e palpitações cardíacas. Além disso, esses picos desregulam a produção de neurotransmissores como a serotonina e a dopamina, responsáveis pelo humor e bem-estar, abrindo as portas para a irritabilidade, a instabilidade emocional e a dificuldade de concentração.
Ainda, o consumo excessivo de açúcar desencadeia um processo inflamatório no sistema nervoso central chamado neuroinflamação, que prejudica a comunicação entre os neurônios e ainda contribui para o surgimento de transtornos mentais como a ansiedade e aumenta o risco de doenças neurodegenerativas como Alzheimer e Parkinson.
Bebidas alcoólicas. Apesar de muitas vezes utilizadas como uma “estratégia de relaxamento” e alívio da ansiedade social, as bebidas alcoólicas são depressoras do sistema nervoso central e, a longo prazo, podem agravar os sintomas de ansiedade podendo contribuir para o aparecimento ou agravamento dos transtornos de ansiedade.
Além do efeito inflamatório em todo o trato digestório que, por si só, já atrapalha a produção dos neurotransmissores no intestino, à medida que o álcool é metabolizado pelo corpo, ele: interfere no equilíbrio destes, causando oscilações no humor, irritabilidade, dificuldade de concentração; costuma interferir com a qualidade do sono ( e não descansar o suficiente pode aumentar os níveis de ansiedade e ainda causar depressão) e pode intensificar a resposta fisiológica ao estresse, aumentando a liberação de hormônios como o cortisol.
Importante destacar que o uso cônico de bebidas alcoólicas pode levar à dependência, à tolerância e à síndrome de abstinência, que inclui sintomas de ansiedade intensificados.
Alimentos processados. Esses alimentos, com seus ingredientes artificiais, aditivos químicos e alto teor de gordura, açúcar e sal, desregulam o equilíbrio da microbiota intestinal, essencial para a produção de neurotransmissores como a serotonina, e ainda promovem a inflamação do corpo, incluindo o cérebro. Além disso, alimentos processados costumam ser pobres em nutrientes essenciais para a saúde mental, como vitaminas do complexo B, magnésio e zinco. Estudos indicam que o consumo frequente de alimentos processados está associado a um maior risco de ansiedade, depressão e outros transtornos mentais e, nesse sentido, agem como verdadeiros sabotadores da saúde mental.
Café. O cafezinho nosso de cada dia, tão apreciado pelo seu aroma e efeito estimulante, tem uma relação ambígua e complexa com a ansiedade em virtude da presença de cafeína. Em doses moderadas, essa cafeína pode contribuir para o aumento do estado de alerta, a concentração e o bem-estar. Entretanto, o consumo excessivo de café pode desencadear sintomas de ansiedade como tremores, palpitações e alterações na qualidade do sono. Importante destacar que o impacto do café na ansiedade varia de pessoa para pessoa, dependendo da sensibilidade à cafeína, do estado de saúde individual e de outros fatores.
Bebidas energéticas. Apesar de oferecerem um impulso energético, elas podem cobrar um preço elevado para a saúde mental devido à sua alta concentração de açúcar e cafeína. Já vimos anteriormente os malefícios do açúcar. Já a cafeína em excesso, age como um potente estimulador do sistema nervoso central, aumentado a liberação de hormônios do estresse como o cortisol e a adrenalina, o que pode intensificar a ansiedade, a irritabilidade e a insônia. Além disso, muitas bebidas energéticas contêm aditivos químicos e corantes artificiais que podem afetar negativamente o funcionamento do cérebro.
Refrigerantes. Já falamos isoladamente dos malefícios do açúcar, da cafeína e dos aditivos químicos.Com isso, fica óbvio que uma bebida que combina todos esses ingredientes numa só dose, agem como bombas de ansiedade engarrafadas e podem ter efeitos neurotóxicos, prejudicando o funcionamento do cérebro, do intestino e agravando os sintomas de ansiedade.
Sucos prontos. Podem até parecer uma opção saudável porque têm sempre uma chamada para as frutas mas, muitas vezes, escondem altas quantidades de açúcar e aditivos químicos sob uma aparência atraente. Além do excesso desses componentes, muitos sucos prontos são processados e pasteurizados, o que reduz seu valor nutricional e pode até eliminar componentes benéficos presentes nas frutas frescas.
Como manter esses cuidados nutricionais no Ambiente de Trabalho?
O ambiente de trabalho pode ser um gatilho para a ansiedade, com as demandas específicas de cada atividade laboral, metas a cumprir, prazos apertados, relações interpessoais complexas, dentre outros. É sempre importante, além das técnicas de relaxamento e outras ferramentas para desacelerar o pensamento, desconstruir as percepções equivocadas e reequilibrar suas emoções e sentimentos, manter ativas as estratégias nutricionais abaixo relacionadas para manter a calma mesmo sob pressão e fortalecer e, como consequência, ainda fortalecer a sua resiliência.
- Café da manhã equilibrado: Antes de ir para o trabalho, não renuncie a começar o dia com uma refeição rica em proteínas, fibras e gorduras saudáveis. Ovos, iogurte, frutas e granola, ou uma tapioca com pasta de amendoim são ótimas opções para impulsionar sua energia e manter a saciedade ao longo da manhã;
- Lanches inteligentes: Tenha sempre por perto lanches saudáveis para evitar a fome e as oscilações de humor. Frutas secas, castanhas, granola com baixo teor de açúcar e iogurte natural são alternativas práticas e nutritivas;
- Hidratação constante: Lembre que a desidratação pode afetar o humor e aumentar a ansiedade. Mantenha sempre próximo uma garrafa de água filtrada e beba regularmente ao longo do dia;
- Almoços leves e nutritivos: Faça sempre a opção por um almoço com proteína magra, como frango ou peixe grelhados, acompanhado de saladas e legumes. Evite refeições pesadas e ricas em gorduras, que podem causar sonolência e prejudicar a concentração no próximo turno.
Cuidados além das refeições
- Priorize e cuide do seu sono pois uma noite sob um sono reparador é fundamental para a ativação dos mecanismos fisiológicos de defesa contra o estresse e a plenitude das funções cognitivas;
- Pratique a alimentação consciente, ficando atento(a) aos sinais de fome e saciedade, saboreando plenamente os sabores e vitando comer apressadamente;
- Planeje com antecedência todas as refeições que fará ao longo do dia, enquanto estiver trabalhando, evitando as escolhas não saudáveis quando a fome atacar sob pressão;
- Reserve, sempre que possível, alguns minutos durante a sua jornada de trabalho para sair do seu posto de trabalho e fazer uma pausa relaxante. Respirar lenta e profundamente, alongar-se, conversar com quem gosta, tomar um chazinho calmante e/ou fazer uma caminhada, neutralizam a cascata do estresse e da ansiedade.
Ao decidir incorporar esse conhecimento e essas estratégias relacionadas à nutrição e mudança de hábitos, você já está agindo de forma consciente e responsável para se prevenir ou contribuir com o seu tratamento o aparecimento ou o agravamento dos transtornos de ansiedade.